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Coluna - Josival Pereira

Lições inusitadas do ato de Bolsonaro na Paulista

Por Josival Pereira Publicado em
Jair bolsonaro 20180905003
Lições inusitadas do ato de Bolsonaro na Paulista

Não importa o que aconteça no ato deste domingo na avenida Paulista, em São Paulo, convocado pelo ex-presidente Jair Bolsonaro para supostamente se defender de acusações de que ele teria tramado e tentado dar um golpe de Estado quando ainda estava no exercício de presidência.

Pode até resultar em consequências graves para o organizador principal,

dependendo do teor dos discursos, indicativos de movimentos e possíveis desdobramentos, mas, ainda assim, neste momento, não importa o que aconteça.

Importa o que já aconteceu nas últimas semanas e poucos se deram conta.

O país, acostumado a um Bolsonaro falastrão, provocador e ameaçador, o viu pregando a realização de uma manifestação pacífica, sem faixas, cartazes e palavras de ordem contra quem quer que seja. O viu pedir, repetidas vezes, que nenhum aliado fizesse manifestações nas cidades ou qualquer outro lugar. A preocupação é evitar qualquer discurso contra o STF (Supremo Tribunal Federal), o que pode ser interpretado como tentativa de intimidação e ameaça pública contra a instituição que representa um dos poderes da República.

Vale lembrar que o ex-presidente está sendo investigado no âmbito do STF por tentativa de golpe e abolição do Estado Democrático de Direito, com ameaça até de prisão de ministros da corte. Em outras manifestações, Bolsonaro e aliados vociferavam contra o Supremo e ministros. Agora, quer paz.

Alertado que poderia acabar preso, Bolsonaro declarou em várias oportunidades que não gastaria um tostão no evento, repassando a responsabilidade para o pastor Silas Malafaia, que também alardeou que não usaria dinheiro dos fiéis nos gastos para realização do ato. Pediu também que ninguém fizesse doações para o ato. Essa foi outra mudança de postura que o país testemunhou intensamente nos últimos dias.

Observe-se também o motivo alegado por Bolsonaro para a realização do ato deste dia 25/02: defesa do Estado Democrático de Direito, incluindo aí sua defesa. Os bolsonaristas ainda devem estar perplexos: como uma pessoa que sempre defendeu a ditadura militar vai defender o Estado Democrático de Direito?; como um político que defendeu abertamente a tortura e elogia o coronel Brilhante Ustra, um torturador assumido, vai defender o Estado de Direito?; como um presidente da República que passa quatro anos atacando instituições da República pode realizar um ato em defesa da democracia?; como um presidente acusado de se associar a generais para planejar, coordenador e ordenar a execução de um golpe de Estado promove uma manifestação, repita-se, em defesa do Estado Democrático Direito?

Quem acompanha a cena nacional, certamente, já concluiu que a política parece de cabeça pra baixo nos últimos dias. É impressionante ver Bolsonaro e seus aliados defendendo a democracia.

Existe uma mudança tão radical de postura que, nas últimas horas, Bolsonaro e organizadores do ato da Paulista, segundo a imprensa, estavam divididos em relação a lista de oradores, havendo duras restrições à participação do deputado mineiro Nikolas Ferreira (PL). Pelo que se sabe, os radicais ficarão longe do microfone.

Não dá para deixar de notar também que no último mês, no decorrer da organização do ato, Bolsonaro e aliados baixaram o tom de voz e ficaram tremendamente humildes.

Não importa, pois, o que aconteça na Paulista neste domingo. Vale o que aconteceu nas últimas semanas, que foi ver Bolsonaro e seus aliados aceitarem que existem leis no país que precisam ser obedecidas. Aceitarem que a liberdade tem limites, ou seja, que não se pode alegar o direito à liberdade para cometer crimes. Aceitarem, nem que seja a contragosto, que não existe liberdade de expressão para pregar a favor de golpe de Estado e contra a o Estado Democrático de Direito.

A lição que vai ficar é que a

força direito, defendida pelo Supremo, está sendo capaz de se impor na defesa das instituições da República brasileira. Ver Bolsonaro e bolsonaristas, ainda que por um breve lapso de tempo, falando baixo e defendendo o Estado Democrático de Direito tem que ser pedagógico. E é inusitadamente pedagógico.

A ameaça de prisão contra certa gente pode operar milagre.


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Josival Pereira

JOSIVAL PEREIRA, natural de Cajazeiras (PB), é jornalista, advogado e editor-responsável por seu blog pessoal.

Em sua jornada profissional, com mais de 40 anos de experiência na comunicação, atuou em várias emissoras Paraibanas, como diretor, apresentador, radialista e comentarista político.

Para além da imprensa, é membro da Academia Cajazeirense de Letras e Artes (Acal), e foi também Secretário de Comunicação de João Pessoa (2016/2020), Chefe de Gabinete e Secretário de Planejamento da Prefeitura de Cajazeiras (1993/1996).

Hoje, retorna à Rede Tambaú de Comunicação, com análises pontuais sobre o dia a dia da política nacional e paraibana.