Do milho ao dendê: 12 pratos brasileiros que carregam a herança da culinária africana
Sabores da África atravessaram o Atlântico e se tornaram patrimônio brasileiro
A culinária africana é um dos pilares da herança cultural negra no Brasil, país em que quase metade da população se declara parda ou preta. Segundo o Censo Demográfico 2022 do IBGE, 92,1 milhões de brasileiros (45,3%) se identificam como pardos, enquanto 20,6 milhões (10,2%) se declaram pretos. Com adaptações ao longo do tempo, muitos pratos típicos africanos deram origem a uma gastronomia brasileira rica, variada e cheia de sabor.
A comida africana se distingue pela variedade de ingredientes e formas de preparo, que mudam de acordo com cada região do continente, incluindo carnes, grãos, tubérculos, leite e leguminosas. No Brasil, os pratos trazidos pelos negros escravizados foram reinventados, adaptados aos ingredientes disponíveis e trazidos de outras localidades. Essas versões compõem a rica e diversificada culinária afro-brasileira.
Ingredientes como quiabo, inhame, azeite de dendê, feijão-fradinho e milho, aliados a métodos de preparo como o refogado e temperos marcantes, revelam a presença duradoura da herança africana na culinária brasileira.
Veja alguns pratos brasileiros que carregam a marca da influência africana:
1. Acarajé
Entre os pratos de influência africana, o acarajé se destaca como um dos mais conhecidos e consumidos no Brasil. Feito com feijão-fradinho frito no azeite de dendê e recheado com vatapá, caruru, camarão e molho de pimenta, ele preserva tradições culinárias profundas. O nome vem da língua iorubá: “acará”, que significa “bola de fogo”, e “jé”, que quer dizer “comer”. Inclusive, a técnica de preparo do acarajé é reconhecida como patrimônio cultural imaterial.
2. Caruru
Originalmente, o caruru era um refogado feito com diversas ervas amassadas no pilão, típico da culinária africana. Com o tempo, passou a levar quiabo, camarão seco e azeite de dendê, tornando-se um cozido versátil que acompanha peixes, frango, carnes e outros pratos. Hoje, é um prato emblemático da Bahia e também muito utilizado no recheio do acarajé e do abará.
3. Feijoada
A feijoada é outro prato de grande tradição e presença garantida nas mesas brasileiras, do Norte ao Sul. Sua origem remonta às senzalas, onde pessoas escravizadas aproveitavam pedaços de porco descartados pelos senhores, como orelhas, rabo e pés, e os cozinhavam junto ao feijão-preto. Farofa e laranja completavam a refeição, dando forma à versão do prato que hoje é símbolo da culinária brasileira.
4. Cuscuz
Originário do noroeste africano, o cuscuz é feito à base de milho e geralmente servido com ovo, queijo ou manteiga, embora também exista a versão doce, preparada com leite de coco e açúcar. Uma das primeiras adaptações brasileiras substituiu o trigo pela farinha de milho, mais disponível no país. Com o tempo, surgiram variações regionais, como o cuscuz nordestino e o paulista, que incorpora ingredientes como peixe, tomate, cebola, pimentão e azeitonas.
5. Mungunzá
Feito com grãos de milho branco ou amarelo cozidos com leite e açúcar, o mungunzá teve sua receita enriquecida ao chegar às casas dos senhores, incorporando ingredientes como leite de coco e canela. Também existe a versão salgada, que mistura o milho cozido com carnes de porco. Em algumas regiões fora do Nordeste, a versão doce é mais conhecida como canjica.
6. Pamonha
A pamonha, iguaria querida em todo o Brasil, carrega uma influência africana que muitas vezes passa despercebida. Ela é uma adaptação do bolinho africano conhecido como acaçá, feita com milho misturado ao leite e enrolada na própria palha. Existem versões salgadas e doces, algumas com queijo, que mostram a versatilidade desse prato tradicional.
7. Vatapá
O vatapá é um creme típico da culinária afro-brasileira, feito com pão amanhecido molhado e farinha de mandioca ou trigo. Geralmente acompanha peixes e frutos-do-mar, e seu preparo é marcado pelo uso generoso de temperos, como pimenta, cravo, cebola, coentro, azeite de dendê e outros condimentos.
8. Moqueca
A moqueca baiana é outro exemplo emblemático da herança africana na culinária brasileira, especialmente em Salvador, que abriga a maior comunidade negra fora do continente africano. O uso do azeite de dendê, símbolo da tradição afro-brasileira, junto ao leite de coco, influência indígena, cria uma combinação única e saborosa.
Outra moqueca bastante conhecida é a capixaba, típica do Espírito Santo. Diferente da versão baiana, ela não leva leite de coco nem azeite de dendê, sendo preparada com peixe, limão, tomate, azeite, coentro, cebola e tintura de urucum.
9. Bobó de camarão
O bobó de camarão é um dos pratos mais emblemáticos da Bahia e carrega forte influência africana. Originário do ipeté, é preparado com azeite de dendê, inhame, camarão, cebola e gengibre. Sua tradição vai além da gastronomia, o prato também faz parte dos rituais do candomblé, sendo associado ao orixá Oxum, o que ajudou a consolidar sua presença nas mesas baianas.
10. Angu
O angu, comida de origem africana, era originalmente preparado como uma papa de inhame, substituído no Brasil pelo fubá misturado com água. Extremamente simples, era muito consumido por ser barato e nutritivo, capaz de sustentar por bastante tempo. Em algumas versões, era servido com miúdos de porco ou boi, tradição que permanece até hoje no “angu à baiana”, mais cremoso e saboroso.
11. Cocada
A cocada surgiu da abundância de coqueiros na costa brasileira e da prática, comum nas grandes fazendas de cana-de-açúcar, de ralar o coco e misturá-lo a uma calda de açúcar. O doce pode variar em cor, do claro ao escuro, e em textura, mais seco ou cremoso, dependendo do ponto em que é retirado do fogo.
12. Quindim
O quindim é resultado da adaptação de um doce português chamado Brisa-do-Lis, feito com gemas, açúcar e amêndoas. No Brasil, mulheres africanas, sem acesso às amêndoas, substituíram-nas por coco ralado, criando uma receita única que conquistou o paladar brasileiro e se tornou um clássico da confeitaria nacional.



