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Economia digital

Criptografia geopolítica: como blockchains são usadas para contornar sanções e criar infraestrutura financeira alternativa

Por Redação T5 Publicado em
Blockchain
Corrida tecnológica redefine fronteiras da geopolítica monetária (Foto: Freepik)

A intensificação das sanções econômicas impostas por potências ocidentais tem impulsionado uma busca acelerada por tecnologias financeiras descentralizadas em diversos países. Rússia, China e Venezuela têm investido fortemente em sistemas baseados em blockchain, tentando criar redes seguras e soberanas de pagamento internacional. 

Essa corrida tecnológica redefine as fronteiras da geopolítica monetária, pois moedas digitais estatais e criptoativos estão se transformando em instrumentos de defesa econômica diante do congelamento de reservas, restrições comerciais e bloqueios de transferência entre bancos tradicionais.

A arquitetura de uma nova economia digital soberana

Os debates sobre moedas digitais de banco central frequentemente intersectam o universo das criptomoedas comerciais, e é nesse ponto que o comportamento de mercados descentralizados torna-se relevante. Modelos de verificação de transações, transparência de blockchain e segurança inspiram inovações analisadas por veículos especializados como noticias Ethereum, que acompanham o impacto da tokenização, das carteiras digitais e do desenvolvimento de smart contracts em ambientes regulatórios distintos. 

O avanço dessas tecnologias revela como a descentralização dos registros contábeis serve de base para o desenho de uma infraestrutura nacional capaz de operar fora do alcance de sistemas bancários tradicionais, criando margens para liquidações bilaterais e reduzindo a dependência de intermediários financeiros sediados nos Estados Unidos ou na Europa.

O contexto russo e o contra-ataque ao sistema SWIFT

Desde 2014, a Rússia vem ampliando medidas para reduzir a exposição às redes financeiras dominadas pelo Ocidente. Após as sanções relativas à anexação da Crimeia, Moscou percebeu a vulnerabilidade de seu sistema bancário diante do bloqueio ao SWIFT. 

Como resposta, lançou iniciativas locais de compensação e, mais recentemente, protótipos de redes de blockchain estatais. O rublo digital, em fase experimental, busca permitir liquidações diretas com países aliados sem recorrer a bancos intermediários. 

Paralelamente, empresas russas exportadoras têm explorado contratos baseados em criptografia para amortecer perdas cambiais e garantir acesso a pagamentos transfronteiriços que escapam da vigilância internacional, reforçando a tese de que a digitalização soberana é tanto uma resposta tecnológica quanto política.

China: liderança tecnológica e controle monetário

A China avançou de forma distinta, convertendo a ambição digital em instrumento estratégico. O iuan digital, desenvolvido pelo Banco Popular, não nasce como alternativa às criptomoedas privadas, mas sim como seu contraponto regulado. 

Seu objetivo principal é assegurar vigilância sobre fluxos financeiros domésticos e, em nível internacional, propor uma alternativa ao domínio do dólar. Implementando padrões de interoperabilidade, Pequim tenta emplacar acordos de uso de stablecoins estatais em corredores comerciais da Iniciativa Cinturão e Rota. 

Companhias chinesas de tecnologia financeira oferecem suporte a plataformas regionais de pagamento baseadas em ledger distribuído, enquanto o governo cria padrões técnicos que podem se tornar referência internacional, fortalecendo o papel do país como regulador digital global.

Venezuela e a busca por liquidez em meio ao isolamento

A experiência venezuelana difere em escala e motivação, mas evidencia o mesmo impulso: escapar das restrições financeiras. Com reservas bloqueadas e acesso limitado ao sistema bancário internacional, Caracas anunciou, em 2018, o Petro, token lastreado em petróleo. 

Mesmo com baixa adoção global, o episódio consolidou o uso político de criptoativos como símbolo de soberania. Paralelamente, cidadãos e pequenas empresas locais ampliaram o uso de criptomoedas como o bitcoin e o tether para preservar valor e realizar importações. 

Esse ecossistema informal transformou-se em alternativa parcial ao sistema estatal, criando um mosaico de fluxos que combina economia de sobrevivência e experimentação digital, antecipando práticas que hoje chamam a atenção de economias maiores.

Cooperação entre países sancionados e integração regional

À medida que cada nação desenvolve sua arquitetura digital, despontam evidências de convergência técnica. Rússia e Irã já testam liquidações conjuntas via plataformas blockchain privadas, enquanto Venezuela e Turquia discutem protocolos regionais. A aproximação entre Moscou e Pequim, consolidada em acordos de infraestrutura digital, sugere a formação de um extrassistema financeiro apoiado em moedas digitais locais e em tokens estáveis indexados a commodities estratégicas. 

O uso de tecnologias compartilhadas reduz custos de compliance, mas exige interoperabilidade entre normas jurídicas e camadas técnicas. Essa cooperação ainda carrega dilemas sobre transparência e rastreabilidade, já que a promessa de privacidade esbarra na necessidade de auditoria para evitar fraudes e lavagem de dinheiro.

Desafios regulatórios e impactos no equilíbrio global

O surgimento de uma esfera paralela de pagamentos digitais desafia princípios de governança financeira internacional. Bancos centrais de países não sancionados observam com cautela a expansão de tokens estatais e redes alternativas. O Fundo Monetário e o Banco de Compensações Internacionais têm advertido que, sem padrões comuns, o risco de fragmentação do sistema aumenta. 

Para países emergentes, a oportunidade está em conquistar autonomia; para potências consolidadas, a ameaça consiste na erosão do poder de imposição monetária. Esse embate molda uma nova dinâmica geopolítica, em que infraestrutura digital, confiança criptográfica e diplomacia tecnológica caminham lado a lado, redesenhando fronteiras de influência econômica global.

O futuro das transações e a incorporação da criptografia estatal

A próxima década pode consolidar um modelo híbrido: moedas digitais soberanas com funções de blockchain público parcialmente acessível. A adoção dependerá da capacidade de conciliar eficiência técnica e controle político. Interoperabilidade, segurança cibernética e padrões abertos serão os vetores determinantes do sucesso. 

Se Rússia, China e Venezuela alcançarem estabilidade tecnológica e jurídica em suas arquiteturas, poderão oferecer às economias em desenvolvimento uma alternativa viável às rotas bancárias convencionais. 

A questão fundamental não é apenas tecnológica, mas estrutural: quem deterá a confiança, e, portanto, o poder, no ambiente financeiro digital global. No centro dessa disputa, criptografia e política se confundem em uma mesma equação de soberania econômica.



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