A ficção da polarização e o poder das minorias no Brasil
O Brasil é, efetivamente, um país difícil de se compreender. Complexo, complicado e surpreendente. Por aí.
A convicção dominante nos últimos anos, especialmente na política, e que parece consensual, é a de que o país vive uma profunda polarização, sem qualquer perspectiva de arrefecimento.
Pois essa polarização, que tanto tem gerado confrontos, mortes até, rachas entre famílias e articulações de manifestações com milhares de pessoas, pode ser artificial ou somente uma sensação social. Definitivamente, o Brasil não está dividido, meio a meio ou quase isso, entre direita e esquerda.
Estudo publicado na ultima veja semanal revela, na verdade, que a polarização real atinge ou está sendo produzida por apenas 11% da população cerca de 18 milhões de brasileiros.
A pesquisa foi realizada pela organização More in Common, uma iniciativa internacional criada com o objetivo de construir sociedades e comunidades mais fortes, unidades e resilientes, em parceria com o instituto Quaest. Não é um estudo qualquer: foram entrevistados 10 mil brasileiros de todos os Estados em um questionário de quase 200 perguntas tratando de temas capazes de provocar ferozes debates ideológicos.
A expectativa, que era mais ou menos o que se percebe em discussões de bares, esquinas e reuniões familiares, acabou frustrada. O resultado veio ao contrário.
O achado da pesquisa é que 54% dos brasileiros, um grupo de mais de 88 milhões de pessoas, a maioria dos eleitores, estão longe da polarização, fogem dos embates, não seguem qualquer cartilha partidária, evitam discussões de cunho ideológico, são absolutamente desapaixonados de política e têm capacidade de trafegar entre esquerda e direita sem problemas.
Para chegar a esse resultado, o alentado estudo, pelo que ouviu nas 10 mil entrevistas, definiu a população dividida em seis grupos, com os seguintes resultados:
- progressistas militantes: 5%;
- patriotas indignados: 6%;
- esquerda tradicional: 14%;
- conservadores tradicionais: 21%
- desengajados: 27%
- cautelosos: 27%.
Qual o problema, então?
É que esse grupo majoritário de 54%, capaz de decidir a eleição presidencial, está se passando por “invisível”. Não se manifesta, não se assume politicamente.
Talvez pela sua configuração. A pesquisa revelou que esse grupo de desengajados e cautelosos é composto por eleitores menos escolarizados, mais pobre e religioso e tende a ser conservador nos costumes e adepto de políticas de assistência do Estado.
Do outro lado, a minoria radical dos 11% - progressistas militantes e patriotas indignados - é composta por uma turma barulhenta, virulenta, totalmente engajada e hábil nos debates com alcance digital.
Os embates e confrontos nas redes socais - notadamente no campo da política, opondo bolsonaristas e petistas - é o que tem gerado o clima de polarização da sociedade. Esses grupos chegam a produzir 200 mil notícias de política por dia.
Não sem razão a ideia polarização se torna larga e abrangente. O estudo revela que ideólogos e marqueteiros usam a força dessa minoria para influenciar os demais segmentos sociais. E têm conseguido.
É assim que, no Brasil, tristemente, as minorias têm estabelecido dominação política sobre as maiorias.



