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Josival Pereira

Coluna- Josival Pereira

Centrão tenta imobilizar e finalizar governo Lula antes do round final

O governo Lula nunca teve, em nenhum momento, maioria no Congresso

Por Josival Pereira Publicado em
Camaradosdeputados
O governo Lula nunca teve, em nenhum momento, maioria no Congresso (Foto: Agência Câmara)

As abordagens sobre a propalada crise gerada a partir da decisão do Congresso de revogar decretos do governo majorando a cobrança de itens do IOF (Imposto Sobre Operações Financeiras), através de elevada votação (383 a 98 votos na Câmara e votação simbólica no Senado), tratam largamente o episódio como se o governo Lula tivesse perdido a maioria no Congresso por absoluta incapacidade de articulação política.

Não existe lastro que sustente essas abordagens. O governo Lula nunca teve, em nenhum momento, maioria no Congresso. Saiu das eleições em ampla desvantagem. O PL, partido que reunia a direita mais radical (bolsonarismo puro) elegeu a maior bancada (99 deputados); o os partidos que formam o núcleo do centrão (União Brasil, PP, Republicanos, PSD, Podemos, Avante, etc) elegeram cerca de 220 deputados; PSDB e MDB, que têm votado em sua maioria com o centrão, controlam mais 65 cadeiras. Só aqui já são mais de 380 parlamentares, mais ou menos o mesmo número de votos dados para a revogação do IOF. Esse é o tamanho da oposição a Lula desde sempre, sem falar da soma de outras legendas pequenas.

Do outro lado, a Federação Brasil da Esperança (PT, PV e PCdoB) elegeu 80 parlamentares e as outras legendas de esquerda e centro-esquerda (PSOL, PSB, PDT) elegeram mais 39. Seria a bancada de Lula - 119 deputados e mais alguns votos da bancada do MDB e de outros pequenos partidos.

Governo é minoria

A verdade é que Lula administra com minoria no Congresso. Foi obrigado a ceder quase metade dos ministérios para conseguir alguma governabilidade. Porém, o apoio parlamentar sempre foi extremamente adverso.

O quadro de agora, com a espetacular derrota do governo em torno do desejo de elevar alguns itens do IOF não pode ser tomado como ou apenas como incapacidade ou incompetência da articulação do governo e do presidente Lula. Os partidos do centrão continuam ocupando os mesmos ministérios.

Controle de emendas

Talvez fosse mais razoável se atribuir ao controle na liberação de verbas das emendas parlamentares pelo governo. Na semana da votação dos decretos do IOF, notas na na grande imprensa registravam que a liberação de emendas estava no mesmo patamar do período da pandemia, que era bem baixo.

Os registros de outras votações na Câmara dos deputados, com seguidas derrotas do Executivo, já indicavam que as relações políticas entre Congresso e Governo vinham se deteriorando.

Pela abrangência dos acontecimentos, no entanto, apesar da grande importância para as eleições do próximo ano, não dá para atribuir à crise que se instalou apenas à contenção de emendas parlamentares.

Escândalo das ações emendas

Existem outros fios desencapados. Setores significativos e de destaque da grande imprensa chegaram a cogitar, logo após a votação da revogação do decreto do IOF, que a reação do deputado Hugo Motta e do senador Davi Alcolumbre, presidentes da Câmara e do Senado, respectivamente, tinha a ver com uma investigação em curso na Policia Federal sobre supostos desvios de recursos de emendas que já envolveria 69 parlamentares. Em polvorosa, o Congresso derrotara e tentava subjugar totalmente o presidente para pressiona-lo a tentar conter as investigações na PF e no STF. Se essas informações existem de fato há um espetacular escândalo ganhando corpo, com potencial para mudanças substantivas no processo eleitoral que se avizinha.

Existem, portanto, vários motivos como possíveis explicações para a crise que se instalou em Brasília. Contudo, a razão mais plausível pode ter natureza puramente política.

Golpe branco

Os fatos que emanam de Brasília autorizam a desconfiança de tentativa de aplicação de um golpe branco. É uma teoria com certa potência. No caso do IOF, a odeia pode ter sido usar a avassaladora maioria do centrão no Congresso para derrubar, imobilizar e finalizar o governo Lula com antecedência de um ano e meio e há quase um ano da eleição, ou seja, a dois rounds antes do final oficial da luta.

As articulações do centrão nos últimos meses indicam pressa. Anote-se: formação da Federação União Progressista, pressão para Bolsonaro desistir da candidatura, insistentes tentativas para fazer o governador Tarcísio Freitas decidir se aceita ser candidato ou não e a inquieta e impulsiva movimentação do senador Ciro Nogueira, que fala constantemente, escreve profetizando o fim do governo e já chegou a cogitar o impeachment de Lula.

Não precisa de muito para compreender que um novo processo de impeachment no Brasil seria traumático sem se falar que não existem razões plausíveis no momento para tanto nem Lula é Dilma. Mas existem outras formas (disfarçadas) de impeachment e de golpe político. Uma dessas formas, por exemplo, é a de impedir o governo de governar. Seria exatamente esse o cenário que se tenta instalar em Brasília. O ataque mais forte agora objetivaria evitar qualquer recuperação das forças do presidente e a sua imobilização definitiva.

Pressa e instintos autocráticos

A pesquisa do instituto Quaest com congressistas, publicada no início de semana, qual a maioria dos parlamentares rejeitam as candidaturas de Bolsonaro e Lula, sugere que o centrão avalia que a chance de chegar à presidência da República é agora ou nunca. Bolsonaro está fora da disputa, Lula estaria enfraquecido e a força parlamentar e política do movimento, com a soma de vários governadores, é a mais volumosa de todos tempos (o centrão tem 38 anos de atuação articulada). Esses são fatores que, com certeza, impulsionam os instintos autoritários e golpistas de muitos protótipos de coronéis e pré-projetos de autocratas.

Não custa registrar que o centrão vive a agonia de sempre se constituir em imponente força parlamentar, influenciar em praticamente todos os governos presidenciais desde a redemocratização, mas nunca ganhar uma eleição para presidente. Pode ser aqui que perigo esteja se amoitando.


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Josival Pereira

JOSIVAL PEREIRA, natural de Cajazeiras (PB), é jornalista, advogado e editor-responsável por seu blog pessoal.

Em sua jornada profissional, com mais de 40 anos de experiência na comunicação, atuou em várias emissoras Paraibanas, como diretor, apresentador, radialista e comentarista político.

Para além da imprensa, é membro da Academia Cajazeirense de Letras e Artes (Acal), e foi também Secretário de Comunicação de João Pessoa (2016/2020), Chefe de Gabinete e Secretário de Planejamento da Prefeitura de Cajazeiras (1993/1996).

Hoje, retorna à Rede Tambaú de Comunicação, com análises pontuais sobre o dia a dia da política nacional e paraibana.