Qual a mágica de Hugo Motta?
Hugo obteve 444 votos, a segunda maior votação em eleições para a Mesa da Casa

O deputado federal paraibano Hugo Motta (Republicanos) segurou a parada desde outubro, quando se lançou candidato, superou intrigas e artimanhas de antigas raposas políticas, e se elegeu presidente de Câmara dos Deputados como planejado: com apoios de todos os lados e ampla votação. Obteve 444 votos, a segunda maior votação em eleições para a Mesa da Casa (a maior é a da reeleição de Artur Lira, que chegou aos 464 votos), mas é a maior numa primeira disputa (em 2021, Lira só obteve 302 votos). Virou o presidente mais jovem da Câmara dos Deputados.
Talvez por toda toda a expressividade, sobram perguntas sobre essa eleição de Hugo? Como um parlamentar de apenas 35 anos de idade consegue o apoio de 18 partidos políticos num país ideológica e politicamente conflagrado? Por que recebeu o apoio incondicional do então todo-poderoso presidente Artur Lira, na cadeira de quem agora está assentado? Por que Hugo Motta conquistou o apoio do presidente Lula e do ex-presidente Jair Bolsonaro, os dois maiores inimigos políticos nacionais? Qual a mágica deste jovem político do Nordeste do Brasil?
Por partes:
O apoio dos 18 partidos faz parte de um processo interno no parlamento brasileiro em busca de poder financeiro, que se traduz no abocanhamento de cada vez farto de pedaço do orçamento nacional através de emendas parlamentares (impositivas, secretas, pix ou de comissões). Essa fatia chegou aos R$53 bilhões em 2024. Não existe nada igual no mundo. Em 2010, esse valor era de R$13 bilhões. A busca insana por emendas transformou os partidos com atuação no Congresso num grande consórcio, não importando as questões políticas ou ideológicas. Funciona o espírito de corpo (algumas vezes de porco também).
Nesse contexto, o mérito de Hugo é ser uma face nova, assegurando diálogo, entendimento, mais foco no país. O Congresso não tem futuro brigando com o Executivo e o Judiciário.
Não tenham dúvidas, porém, o novo presidente da Câmara não receberia o apoio de tantos partidos se não se comprometesse em manter o poder sobre o orçamento e o esquema de distribuição de emendas.
Sobre o apoio incondicional do deputado Artur Lira, que viabilizou a candidatura e posteriormente grande parte dos apoios partidários a Hugo Motta, vale observar o seguinte. Notas na imprensa e bastidores de Brasília indicam que o compromisso do grande consórcio partidário com Lira é o que ele permanecerá no controle do processo de distribuição das emendas parlamentares. O deputado Artur Lira confiou em Hugo para o cumprimento do acordado.
Em relação a Lula e Bolsonaro, existe um assunto caro aos dois, que é o projeto de anistia aos envolvidos no atos antidemocráticos de 8 de janeiro de 2023. Bastidores e a leitura de linhas e entrelinhas na imprensa nacional sugerem que, ao presidente Lula, que não quer a anistia, Hugo teria prometido não tomar a iniciativa de colocar o projeto em pauta. Ao ex-presidente Bolsonaro, haveria o aviso que o projeto não será pautado pela presidência, mas a sinalização é que a Mesa não barrará a votação se os líderes partidários pautarem ou se o plenário aprovar urgência de tramitação.
Em seu primeiro discurso, Hugo Motta condenou as ditaduras e defendeu a Constituição e a democracia, pontos tomados como sinalização que não pautaria a anistia. Parece sinalização, mas, havendo um movimento parlamentar robusto em contrário, nada indica que a promessa a Bolsonaro não possa ser cumprida.
A verdade é que nenhum parlamentar consegue se eleger presidente da Câmara dos Deputados sem assumir compromissos com os vários grupos de pressão. Isso, entanto, não tira ou reduz méritos do paraibano Hugo Motta. O mérito, por exemplo, de em 14 anos de mandatos se fazer confiar por grupos políticos distintos e complexos, por se tornar um politico moderado e afeito ao diálogo diante de tanto radicalismo, por esbanjar habilidade política e por conseguir fazer a leitura correta de conjuntura e se apresentar como o nome ideal para dar nova cara à Câmara dos Deputados, envolvida nos últimos 10 anos em conflitos com o Executivo e o Judiciário, em brigas quase que permanentes. A garantia de Hugo é a de promover o diálogo e, em consequência, o entendimento. Está tendo a atenção de praticamente todas as forças políticas. Pode dar novo foco ao parlamento.
O grande desafio é, com certeza, tentar resgatar ou melhorar a imagem na Câmara dos Deputados, que há muito aparece arranhada nas pesquisas de opinião. Em seu primeiro discurso, Hugo fez acenos neste sentido, prometendo uma Câmara comprometida com a solução dos problemas do país e defensora da Constituição e da democracia.
Não será fácil, mas Hugo tem juventude e, paradoxalmente, bastante experiência para buscar novos caminhos para o desgastado e viciado Poder Legislativo brasileiro.